segunda-feira, 13 de junho de 2011

The sound of music parte final

"Só eu sei
As esquinas por que passei
Só eu sei só eu sei
Sabe lá o que é não ter e ter que ter pra dar
Sabe lá
Sabe lá
E quem será
Nos arredores do amor
Que vai saber reparar
Que o dia nasceu
Só eu sei
Os desertos que atravessei
Só eu sei
Só eu sei
Sabe lá
O que e morrer de sede em frente ao mar"




       Na praça central da cidade,os transeuntes apressados,diminuiam o ritmo dos passos,até pararem por completo e ficavam embevecidos por aquela música."Ele toca e canta muito bem pra um mendigo",diziam.Alguns achavam seu rosto  vagamente familiar,principalmente aqueles que frequentaram um certo bar ou foram alunos de uma certa escola de música.Não,aquele rapaz maltraplilho,de  cabelos compridos,barbudo,não poderia ser aquele charmoso cantor  ou o inteligente professor que conheceram.Se ele fosse cantor ou professor,não precisaria estar pedindo esmolas,pois,sim,era de esmolas que ele estava vivendo.E dormindo no banco da praça.Mas existiu uma pessoa que reconheceu que o mendigo e o professor-cantor Orfeu eram a mesma pessoa.E não se conformava com isso.Achava que tanta beleza,tanto talento,não poderiam ser  desperdiçados..Por causa de uma garota?Já faziam cinco anos que Eurídice morrera,e ele não conseguiu superar ainda.Parece que entrou numa depressão profunda,largou os empregos e vivia perambulando nas ruas,parecia que tinha ficado louco."Por que enterrar-se vivo por uma garota que está morta,quando existem muitas outras disponíveis e vivas,como eu,mais viva do que nunca!",pensou  Helena,"preciso dar um jeito nisso,preciso ajuda-lo a sair desse buaco em que se enfiou"Depois de varias vezes cruzar com ele na praça,resolveu abordá-lo.
     -Orfeu!Que prazer em revê-lo!
     Ele a encarou,mas não mostrou reconhecimento em seus olhos.Ela percebeu.
     -Lembra?Sou Helena,sua ex-aluna da Escola de Música.Eu morava na mesma rua que a Eurídice morava!
     A menção do nome de Eurídice ainda  doía e provocava uma onda de tristeza nos seus olhos,mesmo depois de todos esses anos.Acabou se lembrando de Helena.Uma lembrança não muito agradável.Lembrava-se dela insinuando-se para ele de maneira descarada,mesmo sabendo que era namorado da amiga.Aliás,até na frente da própria Eurídice,que mesmo percebendo,não deu a mínima,por saber que era a única pra ele."Era não,é"pensou.Percebeu que ela começou a se aproximar dele,e ele instintivamente afastou-se.Não estava a fim de conversar.Cantar era o seu único alento.Mas ela não desistiu.
    -Por que você parou de cantar no bar?E parou de dar aulas?Uma pessoa carismática como você,tão talentoso!Poderia ter uma carreira brilhante!
    Orfeu não tinha nada para responder,ela não entederia que nada mais importava.Em vez disso,começou a tocar "Esquinas" de Djavan novamente,ignorando-a.Ela ficou furiosa.Mesmo nesse estado de penúria e mendicância,ainda assim a rejeitava.Se agarrava aquele violão como um troféu.O violão que ele ganhara de Eurídice,ela conhecia a história.
   -Você precisa reagir,está se enterrando vivo!Que tem que estar enterrada é ela,não você!E não vai conseguir sem ajuda!Tem que se desligar do passado,pensar no futuro!E o primeiro passo é se livrar desse violão velho!Vou te dar um novinho em folha!-e arrancou o instrumento das mãos dele,inesperadamente,e ele não teve tempo de esboçar reação.De repente ele saiu de sua apatia e foi tomado por tal fúria,que ela se assustou.Começou a correr com o violão na mão e Orfeu correu atrás dela.
   -Me devolva isso,ele me pertence!-sua voz parecia um uivo de lobo ferido
   -Querido,é pro seu próprio bem,é o primeiro passo para reiniciar sua vida!-e atravessou correndo a rua.
   Orfeu, tentando alcançá-la  seguiu-a na travessia da rua,sem perceber que estava exatamente na direção do trajeto de um carro em alta velocidade.O motorista freou feito um louco,achando que ele era um bêbado ou doente mental.Mas isso não o impediu de ver o mendigo voando por sobre o capô do carro.
    Após levantar vôo por alguns segundos,Orfeu aterrisou alguns metros adiante."Aquela desgraçada!Aonde ela está?"Levantou-se já ia reiniciar sua perseguição por Helena,quando viu um aglomerado de pessoas.No meio delas,a própria Helena,que chorava,com a cabeça entre as mãos.
   -Me d-d-desculpe,não tive a intenção...
   -Helena,eu estou bem,não precisa chorar.Me entrega o meu violão e não se fala mais nisso.
   Mas ela não parecia escutá-lo.Nem mesmo olhava para ele.Olhava para o chão,na mesma direção em que olhavam as outras pessoas.E ele estupefado,descobriu-se também olhando o seu próprio corpo,estendido no asfalto,com uma enorme poça de sangue ao redor da cabeça."Meu,Deus,o que foi que eu fiz?",pensou,
    -Afastem-se,chegou a ambulância!-diziam as pessoas ao redor.Mas a equipe dos bombeiros chegou apenas para constatar que a morte dele tinha sido instantânea.
     Orfeu ficou desnorteado.Se comportara de maneira insana,atravessando na frente do carro.Não tivera a intenção,mas fora negligente.O anjo tinha dito que o suicídio o afastaria ainda mais de Eurídice.Será que considerariam sua morte como um suicídio?Sentou-se no meio fio,com a cabeça a baixa.
     -Eu estava contando os dias pra esse dia chegar!
     Aquela voz.Ele a reconheceria nem que fosse no meio do inferno.
     -Eurídice!E-e-eu achei que tinha a perdido de novo!
     -Claro que não,meu amor!Venha,vamos para casa!
     -Que casa?Onde?Como?
     -Eu vou te mostrar como-e levantou vôo,carregando Orfeu-Eu não disse que a nossa alma é como uma borboleta que sai do casulo?Está na hora de voar!
     -Mas e o nosso violão?
     -Esqueça!Aonde nós vamos tem todos os instrumentos musicais que você quiser.Mal posso esperar para ouvi você tocar só pra mim novamente...
     -Tem razão,eu também!Mas será que você não vai ficar enjoada?Ficar me ouvindo por toda a enternidade?
     -A eternidade,pra gente agora,é nada mais que um segundo....

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